agosto 21, 2019

Carta aos sufocados anônimos



Caro leitor,

Obrigada por gastar um pouco de seu tempo lendo essa carta que talvez não te acrescente nada ou talvez lhe ajude, tanto quanto espero que faça por mim. Desculpe o mau português, as virgulas fora do lugar e tantos outros erros que posso cometer conforme escrevo. Os sentimentos estão a flor da pele e talvez os dedos não acompanhem os pensamentos e o que venho tentar contar a você. Talvez por não me conhecer ou por não saber quem você é, seja mais fácil confessar esses pensamentos que me atormentam durante a maior parte de minha vida, medo de coisas que não são reais e que só agora me dei conta de tudo que deixei passar, por causa de projeções. Quem sabe não se sinta assim também, ou já se sentiu, afinal vivemos sobre a condição humana de nos machucarmos e machucamos os outros, e isso é a coisa mais fácil que o ser humano sabe fazer, além de nos iludirmos.

Precisamos falar de projeções.

Dos pais nos filhos, do passado e futuro, de dinheiro e amor. As projeções que nos levam a grandes desilusões e a terrível e temível palavra FRACASSO. Pois fracassar é feio, é errado e lhe faz ser uma pessoa inútil, sem objetivos e até considerada burra. As projeções vem de forma natural como sonhos, ideias e planos. As vezes criamos por conta própria outra nos são impostas, ou aconselhadas. E é aí que quero chegar...
Será que todos os seus sonhos são seu? Será que você realmente os criou, ou lhe lançaram uma ideia e você abraçou? Será que você consegue se ver feliz de verdade realizando esse sonho? Será que essa projeção é realmente boa para você? Quem pode saber se é bom ou não?
Acho que a forma mais fácil de descrever o que vem me atormentando é colocar do seguinte modo: pais projetam a vida do filho, pais aconselham o filho a pensar no futuro, pais projetam o futuro, pais projetam no filho aquele futuro, pais projetam no futuro aquele filho, pais projetam o que acham e como acham que o filho será feliz. Eles esquecem de perguntar ao filho se ele é feliz.
Não condeno os pais por serem assim, querem ver o melhor para o filho, como disse vivemos sobre a condição humana de sermos simplesmente humanos. O problema é quando os pais não perguntam ao filho se ele já é feliz, o que o faz feliz de verdade, esquecem de que viver com as pequenas coisas do momento é melhor do que levantar tanto o nariz para olhar por cima do horizonte distante.  Pois o que está embaixo do nariz, talvez possa ser bom ou fatal.

Imagine crescer pensando nas projeções do futuro bem distante, imagine ser uma garotinha tímida do interior, com pouquíssimos amigos, que passa a maior parte de seu tempo sozinha, por que gosta de estar sozinha. Imagine adultos projetando o modo que você deve agir, pensar, estudar e ser. Imagine projetarem a sua personalidade.
É difícil mas acredito que seja algo comum pois sei que não fui a única criança criada assim. 
As vezes queremos tanto o bem de quem amamos que acabamos sufocando a pessoa sem ela mesma perceber que está ficando sem ar. Peço mais uma vez desculpa a você leitor, e sei que não é muito elegante se desculpar o tempo todo mas essa é uma de minhas falhas que venho tentando abraçar e compreende-la da melhor forma que posso. Tenho medo de entediá-lo, de aborrecê-lo. Medo do que talvez não seja real..Como essas projeções.
Eu penso o tempo todo naquela frase do Renato Russo “Você diz que seus pais não te entendem mas você não entende seus pais’’. Sempre pensei nessa frase e nunca a compreendi de verdade, até o dia de hoje. Na adolescência cantava essa música e me sentia revoltada nessa parte, pois eu não acreditava que fosse verdade, eu só acreditava na parte que meus pais não me entendiam.
Como contei, cresci com muitas projeções do futuro e poucas de quem eu era, me senti perdida, e usava livros como companhia, por que as palavras acalmavam o vazio da minha mente de não conhecer quem sou. E isso tudo é tão normal nos adolescentes que não compreendo como descuidam tanto do que eles falam e sentem. Ignoram e veem como se fosse apenas birra. Será que é birra é mesmo? Talvez seja, talvez não, já perguntou se ele/a é feliz no dia de hoje? E o que aconteceu no seu dia? Até nas respostas supérfluas deles se encontra a verdade. Se acreditam tanto que Deus escreve certo por linhas torta, porque não acreditar em suas respostas?

Projetar é bom, mas nunca projete algo pelo outro. Nunca critique suas escolhas, você nunca vai conseguir se colocar no lugar dele, pois cada um carrega sua própria história e bagagem. Por isso ser empático é acreditar e fazer aquilo que você gostaria que fizessem a você.
E o que falar de pais, eles te amam e você os ama. E talvez seja bom pensar só assim, simples humanos se amando. Como Peninha cantou “Mas não tem revolta não, só quero que você se encontre...” e vamos tentando viver, por que viver é foda demais pra todo mundo.

Portanto leitor, já me sinto grata por você chegar até aqui e continuar lendo esse desabafo atropelado que faço. Obrigada pela paciência.

Agora lhe pergunto: Quem nunca fracassou? Quem nunca se iludiu com suas próprias escolhas? Quem não tem vergonha de seus erros?
Talvez você não tenha vergonha agora mas um dia com certeza já teve, e sabe como é sentir vergonha de errar, mas será que errar é tão ruim a ponto de termos vergonha disso? Erramos muito e vamos passar nossas vidas errando, e isso nos deixa tão humanizados que estranho pensar o quanto achamos ruim.
Criticar o erro alheio sem pensar em como aquela pessoa está se sentindo por ter errado, quem nunca o fez não é? Mas quando somos nós, queremos que os outros sejam compreensivos, acontece que venho refletindo sobre esse lado nosso de não aceitarmos falhar ou que o outro falha. Penso que comigo seja por conta desses medos não reais de projeções futuras não acontecerem ou de não ser merecedora delas. Quem sabe não é o que todos sentem, não?

Caro leitor, eu errei a minha vida inteira e só me perdoei por esses erros hoje, 19 de janeiro de 2018, aos 27 anos de idade, sem carreira, sem perspectiva de futuro ou vida e infeliz, porém com uma grande paz de espirito agora. E sinceramente não troco essa paz por nada. Por que me aceitei sendo finalmente como sou, humana.
Sempre me envergonhei dos erros que cometi do que fiz e do que não fiz, sempre me envergonhei de mim mesma. Já se sentiu assim? É tão comum, e tão besta. Sentir vergonha de si mesmo, ninguém pode se importar tanto com você como você mesmo, e porque então essa vergonha de sermos humanos, como os outros?
Fiz tantas projeções, e nenhuma deu certo. Fiz enfermagem, me formei e nunca trabalhei na área. Lancei um livro mas nunca me tornei escritora de verdade, tente o curso de letras mas fiquei bem longe de me formar. Basicamente nunca conquistei nada, apenas ‘’quase’’, tanto que fui me enfiando em uma concha cada vez mais  a ponto de me sentir a coisa mais inútil da face da Terra. Será mesmo que sou? E quem é que pode responder se sim ou não?

Espero que você esteja compreendendo o que quero dizer, e que faça algum sentindo refletir sobre as nossas vidas. Espero que você lendo sobre o meu fracasso veja que o fracasso é só uma palavra mal colocada. Não é fracasso se estamos construindo a nossa história, não é erro. É VIDA!
Obrigada por me acompanhar nesse emaranhado de sensações, sentimentos e reflexões. Espero que você se sinta melhor de alguma forma depois de ler, pois tenha certeza que o fato de você ler já me ajudou e muito. E escrever essa carta mal traçada é o ponto final de uma tristeza tão equivocada na minha vida.

Abraços.


19 de Janeiro de 2018.

Nenhum comentário:

Postar um comentário